Morre o papa emérito Bento 16 aos 95 anos, 1º a renunciar em 600 anos

Morre o papa emérito Bento 16 aos 95 anos, 1º a renunciar em 600 anos

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Alemão Joseph Ratzinger teve papado marcado por crises entre mudança e tradição.

O papa emérito Bento 16 morreu neste sábado (31), aos 95 anos, em um mosteiro onde vivia no Vaticano. Sinos badalaram logo após o anúncio, em um dia ensolarado na Itália.

A morte ocorreu, segundo nota da Igreja, Católica, às 9h34 (5h34 pelo horário de Brasília). No último dia 28, o papa Francisco pediu orações, dizendo que o antecessor estava muito doente. As últimas imagens conhecidas dele são de um evento da Fundação Ratzinger no dia 1º, em que ele aparece sentado, demonstrando fragilidade.

O Vaticano anunciou que o funeral será realizado no dia 5 de janeiro, em cerimônia presidida por Francisco na praça São Pedro. O corpo de Bento 16 deve ser exposto para as últimas homenagens dos fiéis a partir de segunda (2).

O religioso ficará marcado pela decisão surpreendente, em 11 de fevereiro de 2013, de renunciar ao papado. Desde Gregório 12, em 1415, um pontífice não deixava por conta própria a chefia da Igreja Católica.

Jornais italianos disseram, à época, que ele estava enojado com escândalos sexuais e financeiros na alta hierarquia do Vaticano. Mas a versão acabou não se confirmando, o que favoreceu a tese de que ele, enfermo, e três encíclicas depois, estava debilitado pela rotina de quase oito anos de pontificado.

Já sob o título de papa emérito, após a renúncia, passou a ocupar dependências modestas de um mosteiro nos terrenos do Vaticano, de onde saiu poucas vezes, como, a convite do papa Francisco, seu sucessor, para a missa de canonização de João Paulo 2º (1920-2005), a quem ele sucedera em 2005.

Difícil saber até que ponto Joseph Ratzinger, seu nome original, trabalhou para enfraquecer Francisco, bem mais aberto em questões como divórcio ou relacionamento da igreja com pessoas LGBTQIA+.

Mas um dos consensos biográficos atribui a Ratzinger erudição e preparo teológico excepcionais. Como papa, quis marcar sua presença pelo combate à relativização dos valores religiosos ou morais.

É provável, no entanto, que passe para a história da Igreja Católica pela gestão marcada por denúncias de pedofilia na instituição, uma bomba de efeito retardado que recebeu dos pontificados anteriores.

Reservado e pouco carismático, Ratzinger, ao sair com a mitra papal do conclave de abril de 2005, sucedeu João Paulo 2º, homem que, em mais de 26 anos de pontificado e viagens a 129 países e regiões autônomas, virou uma estrela pop do catolicismo. Bento 16 visivelmente perdia nessa comparação.

Karol Wojtyla, nome original de João Paulo 2º, polonês discriminado pelo comunismo, dedicou parte de suas energias a minar a legitimidade dos regimes políticos na esfera soviética. E, no embalo, neutralizou o crescimento do pensamento de esquerda dentro da igreja. Para essa tarefa, teve como braço direito o cardeal Ratzinger, seu prefeito da Congregação da Doutrina da Fé (ex-Inquisição).

Com o adversário interno neutralizado —bispos progressistas não se tornaram cardeais, como o brasileiro Helder Câmara—, o jogo político, por assim dizer, automaticamente perdeu importância.

A plataforma de Ratzinger, já como papa, tornou-se mais abstrata para a grande massa de católicos.

Bento 16 procurou se contrapor à secularização e à perda do conteúdo espiritual no século 21. Ou, de modo mais radical, disse valorizar a oração à militância, o que os vaticanistas apontaram como ideia bastante conservadora, a exemplo, aliás, das que prevaleceram nas últimas décadas na alta hierarquia da igreja. O último que escapou delas foi João 23, o papa do Concílio Vaticano 2º, que morreu em 1963.

Dentro da mais absoluta ortodoxia, Bento 16 não fez concessões aos preservativos como instrumento de combate à Aids. A eles contrapunha a abstinência, a fidelidade conjugal e ações contra a pobreza.

Não abriu mão da proibição de ordenação de mulheres —um tópico já meio envelhecido entre as feministas católicas— e criticou os homossexuais. Mesmo se opondo ao preconceito homofóbico, afirmou em 2008 que a relativização da diferença entre homens e mulheres era uma “violação da ordem natural” e que a igreja deveria “proteger a humanidade de sua autodestruição”.

*Com Folha

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