Atestado com vacinação pode se transformar em prova de crime premeditado

Atestado com vacinação pode se transformar em prova de crime premeditado

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Bolsonaro nega ter se vacinado para não ser acusado de crime premeditado. Eu explico.

Quando a Covid-19 apareceu, o então ministro Luiz Henrique Mandetta defendeu as teses adotadas em todo o mundo: buscas pelas vacinas e recolhimento até que o vírus fosse controlado. Bolsonaro era o presidente da República. A CPI da Covid revelou que, naquela época, ele montou um verdadeiro gabinete paralelo ao Ministério da Saúde, dominado por defensores da imunidade de rebanho e da hidroxicloroquina. Suas declarações seguiam o que o gabinete paralelo defendia.

Imunidade de rebanho quer dizer o seguinte: deixa o vírus se espalhar até que as pessoas se imunizem naturalmente. Quem morrer, morreu. E, quanto à cloroquina, se acreditarem que ela faz algum efeito, mais e mais pessoas deixarão de e esconder da doença em casa. Para completar lambança, o então presidente da República resolveu também combater as vacinas. Chegou a dizer que quem se vacinasse podia virar jacaré.

Depois Bolsonaro disse que nunca foi contra as vacinas e que seu governo foi um dos que mais vacinou no mundo. Quando deu essa declaração o país era o 37º colocado no ranking internacional de vacinação.

Depois Bolsonaro disse que nunca foi contra as vacinas e que seu governo foi um dos que mais vacinou no mundo. Quando deu essa declaração o país era o 37º colocado no ranking internacional de vacinação.

O ex-presidente age assim: mente sem nenhum pudor. Flagrado numa mentira, ele conta outra mais forte para negar os fatos. Agora diz que o atestado foi fraudado. É uma estratégia.

Sites de checagem de fatos chegaram a levantar que o ex-presidente mentiu pelo menos 6 mil vezes em seu governo. Os casos são variados.

Bolsonaro demitiu o presidente do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais porque os dados dos satélites mostravam que a floresta amazônica sofria níveis recordes de destruição. Chamou o cientista chefe do INPE de mentiroso e até hoje jura de pés juntos que seu governo é o que mais protegeu as florestas.

Os indígenas ianomamis estavam sendo dizimados? Mentira!, diz Bolsonaro. Foi ele quem mais fez pelos pelos povos originários do Brasil.

Faltou oxigênio em Manaus durante a pandemia com centenas de mortos por falta de ar? O ex-presidente proclama que foi tudo uma armação da esquerda e que ele deu todo atendimento à população.

Ele nega inclusive que tenha havido escândalos de corrupção em seu governo.

Não, o então ministro da Educação, Milton Ribeiro, não teve que deixar o cargo por causa dos pastores que mandavam na distribuição de verbas da pasta, segundo o ministro por indicação do próprio Bolsonaro. Os pastores exigiam propinas dos prefeitos e o ministro chegou a ser preso.

Nem Bolsonaro, nem seus filhos, nem Fabrício Queiroz, nem ninguém se envolveu em rachadinhas. E esses gastos todos nos cartões corporativos da Presidência, tudo isso é perfeitamente explicável.

Então por que, quando presidente da República, Bolsonaro usou e abusou de esconder os dados sobre sua gestão na decretação de sigilos por cem anos? Sigilo que atingiu, inclusive, sua própria vacinação contra a Covid.

Segundo revelou agora o atual ministro chefe da Controladoria Geral da União, consta do cartão de vacinação de Bolsonaro que ele se vacinou, sim, contra a Covid, apesar de tanto ter combatido as vacinas e até o uso de máscaras.

Aí o ex-presidente vem e faz o que sempre fez: nega, diz que é mentira, que o cartão de vacinação foi fraudado.

Mas, nesse caso, ele não faz isso somente pelo simples hábito de mentir. Bolsonaro mente porque teme que isto resulte numa prova decisiva para um eventual processo responsabilizando-o pelas centenas de milhares de mortes na pandemia.

Se ele, como presidente da República, atuou para que as pessoas não se vacinassem, sabendo que esta era a forma de se proteger — tanto que ele próprio se vacinou — então pode ser acusado de ter-se utilizado de má-fé.

Má fé inclusive ao protelar a compra de vacinas e promover a não-utilização de máscaras. Má fé na distribuição de um remédio que não faz efeito e na busca de uma imunização de rebanho que seriam, então, crimes premeditados.

Imagina se a Justiça no Brasil ou na Tribunal de Haia, digamos, chegarem a esta conclusão.

*Tales Faria/Uol

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