Um Brasil ambicioso e experiente recebe a Cúpula da Amazônia

Um Brasil ambicioso e experiente recebe a Cúpula da Amazônia

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Carol Porner*

A Cúpula da Amazônia que se realiza hoje em Belém não é um evento rotineiro da agenda internacional, mas a realização de uma escolha prioritária externada pelo atual governo em 16 de novembro de 2022. Para entender a importância da Cúpula e da integração regional para a proteção do bioma amazônico, é fundamental recordar o histórico discurso do Presidente Lula em Sharm-el-Sheik logo após ter sido eleito e ainda antes de assumir oficialmente a Presidência do Brasil.

Tendo sido convidado pelo Egito, país anfitrião da Conferência do Clima da ONU na COP27, Lula aproveitou a primeira viagem internacional para anunciar, na contramão do negacionismo ambiental do governo antecessor, que o Brasil estava de volta e tinha pressa em participar dos debates a respeito do futuro do planeta. Em um discurso legitimado pela experiência de mandatos anteriores, o líder brasileiro desafiou os principais países e a própria ONU a realizarem a COP30 em território amazônico, especificamente na cidade de Belém, que hoje acolhe a Cúpula da Amazônia.

Esta é a principal ênfase do encontro de alto nível: a reativação e a coordenação de políticas e ações entre países que fazem parte da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), entidade socioambiental formada pelos Estados que partilham o território amazônico, quais sejam: Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela.

Criada em 2002, a OTCA responde aos princípios e metas estabelecidos no Tratado de mesmo nome, firmado em 1978. Trata-se do único organismo internacional com sede em Brasília e sempre funcionou com altos e baixos de acordo com os humores geopolíticos. O redesenho da organização em momento de emergência climática poderá trazer maior estabilidade e previsibilidade na coordenação de esforços para garantir, por um lado, o respeito ao princípio da soberania territorial e, por outro, inovar soluções de desenvolvimento regional integrado com inclusão social e responsabilidade climática.

Não há exagero em reconhecer que o Brasil já lidera propostas universalizáveis no campo socioambiental e climático, algo surpreendente após anos de prepotência isolacionista. São pioneiras algumas iniciativas sobre transição energética, assim como projetos de preservação e regeneração de florestas, projetos agroecológicos, de sustentabilidade e de soberania florestal e alimentar, assim como arranjos financeiros e institucionais criativos, que fazem parte de contribuições genuinamente brasileiras ou em parceria com outros países experientes em gestão florestal.

Além dos oito membros integrantes da OTCA, também foram convidados a participar da Cúpula países em desenvolvimento que detêm florestas tropicais, como Indonésia, a República do Congo, a República Democrática do Congo, São Vicente e Granadinas. Também a França, em razão da Guiana Francesa, a Alemanha e a Noruega, estes expressivos contribuintes tanto da OTCA como do Fundo Amazonia, iniciativa gerida pelo BNDES.

No entorno da Cúpula ocorrem diversos eventos paralelos que discutem desenvolvimento sustentável. Têm sido realizadas reuniões ministeriais, eventos com organismos financeiros como a FAO, o BID, o PNUD, PNUMA, CAF, BNDES, NDB e uma enorme quantidade de eventos envolvendo a sociedade civil. Um dos mais impactantes ocorrido nos últimos dias foi o fórum Diálogos Amazônicos, com mais de 400 atividades envolvendo 24 mil pessoas e uma infinidade de olhares sob o lema “nada sobre a Amazônia sem os amazonidas”. As principais conclusões desse amplo processo participativo serão levadas aos líderes da OTCA em forma de demandas e recomendações.

Os resultados da Cúpula serão conhecidos entre hoje e amanhã. Espera-se uma abrangente Declaração de Belém, com entendimentos de médio e longo prazo para os próximos anos. Entre as propostas concretas, vale destacar alguns anúncios como a proposta da Aliança Trilateral, envolvendo as bacias do Brasil e dos dois Congos, a proposta da Coalizão Verde do BNDES, o Centro de Cooperação Policial em Belém, a criação de um Centro Integrado de Tráfico Aéreo, as propostas de financiamento de fundos verdes, de descarbonização, reflorestamento e regeneração florestal, entre outras ações no marco de ressignificação da OTCA.

É, portanto, plenamente justificável a ambição brasileira de sediar a COP30 no ano de 2025, bem como a pressa em voltar aos grandes debates defendendo propostas ousadas como uma governança global – foro multilateral – para a questão climática. Longe de qualquer triunfalismo, o Brasil é o exemplo do que pode acontecer com uma sociedade quando o obscurantismo ambiental assume o poder. Perdemos muito tempo. Perdemos o rumo da preservação das florestas e da natureza, perdemos credibilidade internacional e perdemos grandes oportunidades econômicas e de desenvolvimento regional. É urgente voltar a protagonizar, e não nos falta experiência.

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