Uber, faxina e cozinheiro: a vida de médicos cubanos que ficaram no Brasil

Uber, faxina e cozinheiro: a vida de médicos cubanos que ficaram no Brasil

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Programa símbolo do PT, o Mais Médicos voltará à ativa em um novo formato no terceiro mandato do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva. Modificado pela gestão Jair Bolsonaro (PL) em 2019, o programa tinha ficado marcado por alocar médicos cubanos em regiões remotas do Brasil.

Quando Cuba rompeu com o programa após críticas severas de Bolsonaro, médicos cubanos radicados no Brasil —alguns com família e até naturalizados— optaram por permanecer no país na esperança de voltar a clinicar se o PT retornasse ao poder.

Maria Caridade Morales Gonzales, 60, virou faxineira

maria caridad - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal

Nasci em Holguín, leste de Cuba, e fui para a Havana aos 14 anos para estudar. Aos 24, entrei na Faculdade de Ciências Médicas de Havana: seis anos de curso, três de especialização em clínica médica e mais três em alergia e imunologia.

Tenho uma filha que aos 20 anos veio para o Brasil, se casou e ficou. Como ganhei uma neta, me inscrevi no Mais Médicos para viver no Brasil ao lado delas.

Cheguei em 2015 para trabalhar em Divinolândia, a 490 km de São Paulo. Adorava trabalhar na UBS (Unidade Básica de Saúde) do centro e na roça: uma ambulância me levava e trazia. Ficava o dia todo, até almoçava na casa dos pacientes.

O governo pagava R$ 2.500 e a prefeitura mais R$ 3.000. Nós, cubanos, não somos ambiciosos, eu viva bem, me vestia bem e me virava.”

Depois de romper com Bolsonaro, Cuba quis me levar de volta, mas preferi continuar com minha família. Tentei emprego em farmácia, mas não consegui, e fui para São Caetano do Sul, perto da minha filha.

Trabalhei por um tempo como faxineira, mas tenho 60 anos e não aguentei as dores na coluna. Aí comecei como cuidadora, mas também precisava de força para dar banho em um senhor de 79 anos e ainda limpar a casa, fazer almoço e janta. Agora estou desempregada.

Tenho 36 anos de graduada e a esperança de voltar para minha profissão. Estou estudando sobre os problemas do brasileiro, que tem muita hipertensão, pancreatite e transtorno de personalidade.

Ovidio Lediam Viggiani Sierra, 36, motorista de Uber

Eu me formei em 2011 na Faculdade de Ciências Médicas de Mayabeque: seis anos de medicina, depois três de especialização em clínica médica. Vim para o Brasil em 2014. Fui mandado para um posto de saúde em Campinas (SP): trabalhava até as 17h cuidando da saúde integral da população. A gente também orientava os alunos do quarto e sexto ano de medicina da Unicamp (Universidade de Campinas).

Na época eu ficava com uns R$ 3.000 do salário e ajuda de custo da prefeitura. Depois que fecharam o programa, voltei para Cuba. Arrumei minha documentação e em 2021 voltei com minha mulher e minha filha de nove anos, na esperança de voltar ao Mais Médicos.

Ovidio - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal

Eu levei a documentação para o governo, mas me disseram que não contratavam mais cubanos. Aí fui procurar emprego.

Primeiro fui cuidador de idoso, depois trabalhei em uma fábrica carregando gelo. Não fiquei porque era um trabalho puxado: oito horas em temperatura abaixo de zero para ganhar R$ 80 por dia. Não estudei tanto para isso.

Como tinha habilitação brasileira, comecei a fazer Uber há seis meses. Começo a rodar às 6h30 e vou até 18h. Tiro R$ 2.500 por mês, mas pago o aluguel do carro e a gasolina.

*Com Uol

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