Em uma cúpula histórica da Comunidade do Caribe, o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, reforçou o compromisso de sua administração com a integração regional e a cooperação internacional, destacando a importância da parceria estratégica entre o Brasil e os países caribenhos. O evento, que reuniu líderes de toda a região, serviu como palco para o fortalecimento dos laços e a definição de uma agenda comum para enfrentar os desafios compartilhados.
Lula desembarcou, nesta quarta-feira (28), em Georgetown, capital da Guiana, onde participa, como convidado especial, do encerramento da 46ª Cúpula de Chefes de Governo da Comunidade do Caribe (Caricom). Nesta quinta (29), Lula também se reunirá com o chefe de governo do país vizinho, Nicolás Maduro, quando deve abordar a crise entre Guiana e Venezuela pelo território de Essequibo, disputado pelos dois países.
A Caricom é integrada por 15 países: Antígua e Barbuda, Bahamas, Barbados, Belize, Dominica, Granada, Guiana, Haiti, Jamaica, Montserrat, Santa Lúcia, São Cristóvão e Névis, São Vicente e Granadinas, Suriname e Trinidad e Tobago. É um dos mais antigos blocos de integração do mundo em desenvolvimento, com um PIB combinado de 120 bilhões de dólares e uma população de 19 milhões de pessoas.
Em seu discurso, o presidente Lula ressaltou a mudança de paradigma na política externa brasileira desde que assumiu o cargo em 2003. Ele enfatizou o compromisso de priorizar as relações com os países da América do Sul, América Latina, Caribe e África, rompendo com uma tradição de olhar predominantemente para os países colonizadores e as nações economicamente mais desenvolvidas.
“Quando cheguei à presidência do Brasil em 2003, descobri que tínhamos uma visão limitada de nossas políticas internacionais. Vivíamos de costas para nossos vizinhos na América Latina e no Caribe. Decidimos mudar isso e priorizar nossas relações com nossos irmãos e irmãs nesta região”, afirmou o presidente durante sua intervenção.
Lula destacou os esforços empreendidos para fortalecer os laços diplomáticos e comerciais com os países da Caricom, reabrir embaixadas em nações caribenhas e ampliar a presença brasileira na região. Ele também anunciou iniciativas de cooperação técnica e investimentos para impulsionar o desenvolvimento socioeconômico dos países membros.
“Pavimentar” a integração
Além disso, o presidente ressaltou a importância de ampliar as conexões e rotas de integração entre os países da região, destacando a rota do escudo guianense como uma prioridade para seu governo. Ele enfatizou a necessidade de fortalecer os laços comerciais e de transporte para impulsionar o desenvolvimento econômico e a segurança alimentar na região caribenha.
“Queremos literalmente pavimentar nosso caminho para o Caribe. Abriremos corredores capazes de suprir as demandas de abastecimento e fortalecer a segurança alimentar da região. Nosso objetivo é promover políticas públicas e mobilizar recursos para enfrentar desafios como a insegurança alimentar e as mudanças climáticas, que afetam diretamente nossos irmãos e irmãs caribenhos”, afirmou o presidente.
Outro ponto destacado pelo presidente foi a necessidade de fortalecer a gestão integrada de riscos de desastres, especialmente em face dos eventos climáticos extremos que afetam a região caribenha. O Brasil se comprometeu a apoiar o mecanismo de resposta regional da Agência Caribenha de Gerenciamento de Emergências e Desastres, visando melhorar a capacidade de resposta a crises e desastres naturais.
As discussões durante o evento envolveram temas como desenvolvimento sustentável, segurança alimentar e nutricional. Em seu discurso, Lula abordou temas comuns da agenda do Brasil, que este ano preside o G20 – grupo de 19 países mais ricos do mundo, além da União Europeia e União Africana. As prioridades brasileiras no mandato são a inclusão social e a luta contra a desigualdade, a fome e a pobreza, o enfrentamento das mudanças climáticas, com foco na transição energética, a promoção do desenvolvimento sustentável em suas dimensões econômica, social e ambiental e a reforma das instituições de governança global, que reflita a geopolítica do presente.
Além de propor a abertura de corredores, o presidente convidou os países da Caricom a se juntarem à Aliança Global de Combate à Fome e à Pobreza, iniciativa que será lançada durante a presidência brasileira do G20. Ele ressaltou a importância de promover políticas públicas e mobilizar recursos para enfrentar esses desafios, visando garantir o acesso universal a alimentos e reduzir a pobreza na região.
“É fundamental que trabalhemos juntos para superar os desafios que enfrentamos, como a insegurança alimentar e as mudanças climáticas. Esses problemas têm a mesma raiz: a desigualdade. Portanto, a luta contra a desigualdade no mundo é também a luta das populações caribenhas”, afirmou o presidente durante sua intervenção.
Paz e governança global
Além disso, Lula ressaltou a importância de uma ação conjunta para promover a paz mundial e combater o desperdício de recursos em armamentos. Ele enfatizou a necessidade de reformas nas instituições financeiras internacionais para torná-las mais inclusivas e eficazes na promoção do desenvolvimento sustentável.
Além disso, o presidente ressaltou a importância da cooperação entre o Brasil e a Caricom em fóruns internacionais, como a Assembleia Geral da ONU e o G20, onde ambos compartilham posições convergentes em questões-chave, como a necessidade de ampliar os recursos disponíveis para países em desenvolvimento e promover uma governança global mais justa.
Lula ressaltou a ligação especial entre o Brasil e o Haiti, representada pelos aproximadamente 200 mil haitianos que vivem no Brasil. Ele também anunciou iniciativas de cooperação, como o treinamento oferecido à Polícia Nacional haitiana e a inauguração de um centro de formação profissional para jovens haitianos, no sul do país, com investimento de 17 milhões de dólares.
“A crise de segurança só se resolverá com o avanço do processo político. Temos uma ligação especial com o Haiti, e estamos comprometidos em apoiar o desenvolvimento e fortalecer as instituições desse país irmão. A Caricom é uma parceira fundamental para o Brasil e parte indispensável da nossa visão de integração regional e cooperação internacional”, concluiu o presidente.
A participação do presidente Lula na cúpula da Caricom foi recebida com entusiasmo pelos líderes da região, que destacaram a importância de uma cooperação mais estreita com o Brasil em uma variedade de áreas, desde o comércio até a segurança alimentar e o combate às mudanças climáticas.
A reunião histórica entre o Brasil e os países do Caribe marca um novo capítulo nas relações hemisféricas, com o compromisso mútuo de fortalecer os laços de solidariedade e cooperação para enfrentar os desafios do século XXI.
Voz racional e de estabilidade
Antes do discurso proferido na Caricom, o presidente brasileiro teve agenda de trabalho marcada com Irfaan Ali e com o presidente do Suriname, Chan Santokhi, para tratar de temas de interesse trilateral, como energia e integração da infraestrutura física e digital. Ele se encontraria também com a primeira-ministra de Barbados, Mia Mottley.
Durante a conferência, o presidente da Guiana, Irfaan Ali, destacou o papel do presidente brasileiro como uma “voz racional e de estabilidade” na região, especialmente em meio à disputa territorial entre Guiana e Venezuela pelo território do Essequibo.
Irfaan Ali ressaltou a importância do papel desempenhado por Lula na busca pela paz e estabilidade na região, destacando sua abordagem equilibrada ao lidar com os interesses conflitantes das duas nações vizinhas.
“O presidente Lula tem sido fundamental na promoção do diálogo e na busca por soluções pacíficas para a disputa territorial entre Guiana e Venezuela. Sua liderança regional é crucial para garantir que todas as partes ajam dentro dos limites da lei internacional”, afirmou o presidente da Guiana durante o evento.
A disputa pelo território do Essequibo remonta ao século XIX e tem sido uma fonte de tensão entre os dois países por décadas. O presidente Lula, por sua vez, tem desempenhado um papel ativo na busca por uma solução diplomática para o conflito, participando de negociações e buscando garantir a estabilidade na região. Sua intervenção foi vista como uma vitória diplomática para o Brasil.
A disputa pelo Essequibo envolve questões históricas e territoriais complexas, e a busca por uma resolução pacífica tem sido uma prioridade para os líderes da região. A recente decisão da Corte Internacional de Justiça de que a Venezuela não deve agir para modificar a situação do Essequibo representa um passo importante em direção à resolução do conflito.