Bolsonaro arma bomba para o verão ao secar verba de prevenção a desastres

Bolsonaro arma bomba para o verão ao secar verba de prevenção a desastres

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“Não há dinheiro para contenção de encostas, nem para prevenção de desastres no Brasil.” O aviso foi dado, nesta quinta (1), pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), um dos coordenadores do grupo de trabalho sobre Desenvolvimento Regional da equipe de transição de Lula, em coletiva em Brasília.

Mais cedo, em sua conta no Twitter, Randolfe havia afirmado que “os recursos para ações de resposta a desastres no Brasil estão quase zerados” e que “vidas de milhões de brasileiros foram colocadas em risco” pelo atual governo.

E que as vítimas do deslizamento de terra na BR-376, em Guaratuba (PR), não eram só consequência de um desastre natural, mas da “ausência de investimentos em políticas de prevenção”. Até o momento, o deslizamento, que arrastou carros e caminhões, deixou duas pessoas mortas e 30 desaparecidos.

Randolfe defendeu a aprovação da PEC da Transição a fim de abrir espaço no orçamento para garantir recursos para a prevenção de desastres, coisa que a gestão Jair Bolsonaro não se preocupou em fazer.

Tragédias causadas pela incapacidade de governantes de se prepararem para as chuvas não são novidade. Neste ano, contudo, as energias de Jair Bolsonaro foram destinadas a ações que lhe garantissem votos, como transferência de dinheiro e pagamento de vouchers.

Se ganhasse, correria para tentar consertar o orçamento fictício que enviou ao Congresso. Se perdesse, dane-se. Afinal, acredita que a culpa pelos mortos das chuvas a partir de janeiro será de Lula.

Não que ele tenha assumido em algum momento a responsabilidade que o cargo exige. Em fevereiro, ele terceirizou para o imponderável a tragédia em Petrópolis ao afirmar que “não temos como nos precaver de tudo o que possa acontecer”. E ainda pediu a Deus que tragédias assim “não ocorram mais”. Contudo, a prevenção de catástrofes é tarefa das autoridades e plenamente possível desde que os governos municipal, estadual e federal tivessem trabalhado corretamente, o que não foi o caso.

Pois uma coisa é a triste ocorrência de fatalidades que podem escapar mesmo à mais rígida aplicação de políticas públicas de moradia, urbanização, alerta e remoção e de combate às mudanças climáticas. Outra coisa é a contagem de corpos ter ultrapassado ultrajantes 230 vítimas.

Um número assim não é decorrência de um acidente, mas de um projeto que pensa as cidades para os mais ricos enquanto empurra a força de trabalho para locais perigosos, empilhando-a em morros e a comprimindo-a em várzeas de rios, sempre à espera da próxima tragédia. E nega recursos para a garantir da vida dessa parcela da população.

A busca pela terceirização de responsabilidade feita pelo presidente foi reforçada por seu ministro do Desenvolvimento Regional, e hoje, senador eleito, Rogério Marinho, que culpou a quantidade de chuvas que, segundo ele, “nenhum meteorologista previu”. Ainda teve a pachorra de falar que, até o ano passado, a pauta era a seca no país, como se tempestades não matassem no Estado do Rio todo verão.

A lama que mata nas montanhas nas chuvas não é fator desconhecido, pelo contrário, é uma visitante recorrente. Por exemplo, em 11 de janeiro de 2011, 918 pessoas morreram em diversos municípios da região serrana do Rio após deslizamento de terra; em 5 de fevereiro de 1988, 134 perderam a vida após um temporal na mesma Petrópolis; em 18 de março de 1967, 436 pessoas morreram nos deslizamentos de Caraguatatuba (SP); entre 1966 e 1967, a lama causou centenas de mortes na Serra das Araras, no Rio – não há um registro oficial, mas contagens variam de 400 a cerca de 2000.

Em todos esses casos, bem como na atual tragédia no Paraná, as mortes poderiam ter sido evitadas seja com obras para evitar deslizamentos, seja com políticas de moradia que construam casas em locais fora de risco, com pesquisas para o levantamento de novas áreas de risco, com o desenvolvimento e aplicação de protocolos de retirada emergencial e recolocação de forma decente e digna, com políticas de adaptação e mitigação de mudanças climáticas.

Como já disse aqui, o Brasil não precisa de gestores que peçam a Deus para evitar e mitigar novas catástrofes, como se elas fossem fato consumado, mas de gente dedicada a resolver o problema por conta própria. Infelizmente, muita gente esquece disso na hora de votar e escolhe a pessoa simplesmente porque ela abraça o seu pastor.

A tragédia das chuvas não começou com esses representantes, nem terminará com eles. Porque, apesar do caminho para começar a resolver tudo isso ser bem conhecido, a principal política pública diante das mortes por deslizamento de terra no Brasil tem sido o sobrevoo de autoridades por helicóptero.

*Leonardo Sakamoto/Uol

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