Atos no Brasil e em NY têm algo a nos ensinar: lugar de golpista é a cadeia

Atos no Brasil e em NY têm algo a nos ensinar: lugar de golpista é a cadeia

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Reinaldo Azevedo – A gritaria golpista que algumas dezenas de bolsonaristas promovem desde domingo em frente ao hotel em que estão hospedados ministros do Supremo e outros convidados do Lide Brazil Conference, realizada nestas segunda e terça no Harvard Club of New York, está, sim, a nos dizer alguma coisa. Atentemos para a mensagem.

O evento tem o apoio da BACC (Brazilian-American Chamber of Commerce), uma organização independente e sem fins lucrativos, que busca estimular a cooperação entre Brasil e EUA. Para lembrar: participam do encontro, entre outros, cinco membros do STF — Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Luís Roberto Barroso e Ricardo Lewandowski —; um ex-presidente do tribunal (Carlos Ayres Britto); um ex-presidente da República (Michel Temer); o atual presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto; um antecessor seu (Henrique Meirelles); Isaac Sidney, presidente da Febraban; Persio Arida (do grupo de transição na área econômica), e o megaempresário Rubens Ometto, presidente do Conselho de Administração da Cosan. Há outros pesos-pesadíssimos por lá. Para os fascistoides que pedem intervenção militar no país, são todos comunistas, safados e ladrões.

A estupidez em solo estrangeiro faz eco àquelas que se dão às portas dos quartéis, com a aquiescência da nota criminosa assinada pelos respectivos comandantes das Três Forças, que resolveram bater continência para a baderna, confundindo a Constituição com um coturno velho e sujo.

Liberais de meia-tigela, que não passam de bolsonaristas acovardados — consideram-se moralmente superiores a essa horda que intimida e ataca pessoas nas ruas —, convidam-nos, em artigos que pretendem pudorosos, a entender o que chamam “mensagem das ruas”, como se os arruaceiros tivessem alguma lição a nos dar. Tomam a intolerância e a truculência como uma visão de mundo que merecesse ser respeitada.

Sim. Estou com os ouvidos atentos. Já entendi o recado. É preciso que o Ministério Público, a Polícia e a Justiça deem a devida resposta àqueles que, de maneira inequívoca, recorrem a pretextos e a mentiras comprovadas para tentar pôr fim a um regime de liberdades, disciplinado pela Constituição. Essa gente passa uma mensagem clara: precisa ser reprimida e responder por suas escolhas. A democracia é o regime em que nem tudo pode.

Tenho noção, é claro!, das dificuldades que estão postas para pôr fim os atos destrambelhados. Ainda que os recalcitrantes da ordem legal sejam uma extrema minoria, são numerosos o bastante para criar dificuldades objetivas às forças da ordem. Meter todos em cana, como merecem, seria difícil, e o espalhafato de tal decisão acabaria funcionando à autovitimização.

É evidente que eventos dessa natureza não se dão por geração espontânea. Há os que os planejam. Há os que os financiam. Há os que os organizam. Há os que se encarregam da propaganda — alguns, inclusive, fingindo falar uma linguagem jornalística. O aparato legal de defesa da institucionalidade deve se voltar contra esses espertalhões. Embora ninguém possa pretextar ignorância da lei para justificar atos criminosos, temos de considerar que parte dos ditos “manifestantes” nem sabe direito por que está à porta dos quartéis. Podem até adorar Bolsonaro e odiar Lula. Isso é do jogo. Mas quem lhes disse que se muda o resultado de uma eleição no berro? Ou que os militares podem decidir o destino dos demais Poderes? A ignorância da lei não os perdoa, mas os coloca no fim da fila das prioridades em matéria de segurança do Estado democrático.

Bolsonaro cometeu dezenas de crimes de responsabilidade. Morrerão com o seu mandato. Os comuns, no entanto, não se extinguem no dia 1º de janeiro. Tem de responder por eles, a exemplo dos que promovem e financiam a baderna. O lugar dessa gente é a cadeia. À diferença do que afirmou aquela nota destrambelhada dos comandantes militares, inexiste excludente de ilicitude para pedir golpe. Ao contrário. Esses criminosos infringem os Artigos 285, 359-L, 359-M e 359-R do Código Penal.

NUNCA MAIS
É uma aberração que a “democracia” tenha sido o elemento de clivagem da eleição deste ano. Isso não aconteceu nem no pleito de 1989, o primeiro depois da ditadura. Os vários tons de progressismo tinham justo horror a Collor, mas não o viam como um golpista. E, de fato, não era a linguagem que falava. Avançamos 33 anos no tempo e, no entanto, regredimos na história. De impunidade em impunidade, chegamos a essa situação miserável, patrocinada pela Procuradoria Geral da República e, por óbvio, pelo Centrão.

Estejam no Brasil ou em Nova York, os bolsonaristas têm de saber que há consequências legais para quem prega o rompimento da ordem, promove arruaças em defesa da ditadura e ataca pessoas em locais públicos porque suas adversárias ideológicas reais ou supostas.

Sim: eu estou atento para a mensagem que chega das ruas. Ela me diz que a impunidade está na raiz da violência institucional. O resto é conversa de bolsonarista enrustido.

*Uol

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